Cotidiano

Sem espaço no ginásio, venezuelanos constroem ‘favela’ na área externa

Venezuelanos construíram barracos cobertos com lonas no terreno do Ginásio do Pintolândia, onde os demais dormem amontoados

Com o grande número de estrangeiros que chegam ao Centro de Referência ao Imigrante, no Ginásio do Pintolândia, zona oeste da Capital, onde estão abrigados cerca de 400 venezuelanos, entre adultos e crianças, uma “favela” surgiu na área externa do abrigo. Com a falta de vagas dentro do ginásio, os imigrantes começaram a improvisar barracos de lona.

No local, há mais de dez moradias de forma precária, no chão de terra batida, forrado com plástico por causa do terreno molhado devido às chuvas. Para a água não invadir o barraco, as famílias fazem pequenas contenções cavando valetas ao redor do espaço ocupado.

Segundo o indígena Ramon Gomez, os imigrantes estão há quase sete meses no ginásio recebendo roupas e comida para sobreviver. No entanto, com a chegada de mais pessoas nos últimos três meses, a situação tem se tornado cada vez mais difícil em relação ao espaço para dormir, se alimentar e se vestir.

No que diz respeito à alimentação, os estrangeiros dizem que contam com doações da população e da entidade Fraternidade – Federação Humanitária Internacional, que chegou a pedir donativos em supermercados. Após recolher as doações, Gomes relatou que a Defesa Civil auxilia no transporte, organização e distribuição.

Os estrangeiros ainda precisam de doações, tendo em vista a chegada de mais gente. “A crise está cada vez mais forte e que as pessoas precisam buscar outros meios e lugares para viver”, disse o estrangeiro. As doações de alimentos e roupas podem ser realizadas no local, de segunda-feira a sábado, das 9h às 14h.

Em relação à saúde, eles ressaltaram a necessidade de atendimentos médicos semanais. Por conta da variação climática de calor durante o dia e frio durante a noite, a maioria das cerca de 60 crianças estão enfermas, apresentando febre e diarreia, principalmente.

Outro ponto que afeta a saúde é a hora de dormir. Quem está no ginásio precisa se amontoar pela falta de espaço. Quando chove, aparecem goteiras do ginásio. Para quem dorme sob as lonas no lado externo, as famílias relatam a presença de bichos e mosquitos, além do perigo de ter as lonas e barracas derrubadas por conta das chuvas. Cerca de 100 pessoas estão vivendo na área externa do ginásio.

Diante da situação na hora de dormir, Gomez solicitou ajuda na questão de limpeza e desinsetização do ginásio. Segundo ele, os bichos que rondam o local podem trazer doenças, tanto durante o dia, com as moscas, quanto à noite com os mosquitos.

TRABALHO – Desempregados há sete meses, Gomez e outros estrangeiros frisaram a importância de um trabalho específico. “Eu pessoalmente quero trabalhar para conseguir manter minha família”, frisou. Como sugestão, ele explicou que tem interesse em cultivar hortaliça no terreno do ginásio, a fim de que possam começar a produzir o próprio alimento.

SEM ESCOLA – Nenhuma das crianças no local frequenta ou possui qualquer tipo de educação escolar no ginásio. Diante do caso, Ramon Gomez explicou que realiza um trabalho voluntário junto a outros venezuelanos, colocando as crianças para aprender algo que possa estimular o pensamento.

Segundo os pais estrangeiros, ainda é um incômodo a falta de educação para eles, por isso Gomez enfatizou que é necessário um espaço específico para o estudo das crianças, a fim de que possam se concentrar na hora dos ensinamentos.

GOVERNO – A Defesa Civil informou que realizou uma topografia do terreno em torno do Ginásio do Pintolândia, na semana passada, e que será feito o nivelamento, construção de banheiros na área externa e reparos em geral, incluindo telhado e instalação hidráulica da estrutura. A verba para a reforma é proveniente de recursos estaduais, federais e de doações.

Sobre os atendimentos médicos, informou que são realizados acompanhamentos toda quarta-feira, além dos atendimentos durante todos os dias dos casos mais graves. Frisou que existe um projeto para implantação de uma horta no local, mas o início da execução só será possível após o serviço de nivelamento do terreno.

EDUCAÇÃO – No que diz respeito à educação das crianças, o órgão enfatizou que a etnia Warao tem uma característica nômade, sendo que são poucas as que estão realmente se estabelecendo em Boa Vista. Contudo, devido à complexidade cultural existente, a melhor forma de proporcionar a educação está sendo trabalhada. “São realizadas aulas de português, com a ajuda de voluntários e dos membros da Organização não Governamental (ONG) Fraternidade”, frisou.
(A.G.G)

MPF e DPU querem isenção de taxa e garantias de direitos aos imigrantes

O Ministério Público Federal em Roraima (MPF/RR) e a Defensoria Pública da União (DPU) ajuizaram ação civil pública visando à dispensa do pagamento das taxas cobradas pela União para a regularização da situação jurídica dos estrangeiros imigrantes no país. Em Roraima, devido à grave crise humanitária que atravessa a Venezuela, um grande número de pessoas têm migrado para o Estado, muitas delas com histórias trágicas de fome. Somente neste ano, a Superintendência da Polícia Federal registrou mais de oito mil pedidos de refúgio.

Atualmente, conforme resolução do Conselho Nacional de Imigração (CNIg), para ter acesso à residência temporária de dois anos, é necessário o pagamento de taxas que totalizam R$ 311,22 por pessoa, valor exorbitante para a maioria dos migrantes, haja vista a situação de miséria que se encontram. A cobrança tem inviabilizado a utilização da residência temporária pelos migrantes mais carentes. Para regularizar a situação no Brasil, a maioria deles tem optado por pleitear o reconhecimento da condição refugiado, o que tem sobrecarregado o Comitê Nacional para os Refugiados, órgão responsável por analisar os pedidos e declarar o reconhecimento.

O MPF e a DPU requereram, então, a imediata dispensa do pagamento das taxas para fins de requerimento de concessão de residência temporária. O benefício deverá ser concedido apenas aos estrangeiros carentes, que tenham ingressado no território brasileiro por via terrestre e sejam nacionais de país fronteiriço, para o qual ainda não esteja em vigor o Acordo de Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul e países associados. Como prova da vulnerabilidade econômica, conforme o pedido aduzido na ação será aceita declaração de hipossuficiência, salvo se existir prova que indique não se tratar de pessoa carente.

RECOMENDAÇÕES – Por meio da Procuradoria Regional de Direitos do Cidadão e do Ofício de Defesa dos Direitos Indígenas e Minorias, o MPF/RR também expediu cinco recomendações visando à garantia dos direitos dos migrantes venezuelanos de acesso à educação básica, à liberdade e segurança pessoais e à assistência social.

Os documentos são direcionados ao Ministério da Educação (MEC), Secretaria Estadual de Educação e Desportos (Seed), secretarias municipais de Educação e Cultura de Boa Vista e Pacaraima, Fundação Nacional do Índio (Funai), Coordenadoria Regional da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Roraima, prefeituras de Pacaraima e Boa Vista, Secretaria Municipal de Gestão Social de Boa Vista, Secretaria Municipal de Assistência Social de Pacaraima, Secretaria de Segurança Pública do Estado de Roraima (Sesp) e à Polícia Militar.

EDUCAÇÃO – O MPF/RR recomendou a realização da matrícula no ensino fundamental e médio de todos os alunos de países estrangeiros, independente de portarem todos os documentos necessários. O MEC e as secretarias de Educação terão 30 dias para apresentar cronograma detalhado das providências administrativas necessárias à implantação da medida. (Recomendação nº 10/2017)

ASSISTÊNCIA SOCIAL – Outra recomendação foi para as prefeituras de Boa Vista e Pacaraima, para que integrem efetivamente as ações de assistência aos venezuelanos, em especial aqueles em situação de rua e abrigados no Centro de Referência do Imigrante, no caso da Capital.

Deverá ser elaborado, no prazo de 10 dias, um plano técnico para prestar aos migrantes em Boa Vista e Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, serviços socioassistenciais, programando atuação específica da rede assistencial (principalmente Creas e Cras) para viabilizar a essas pessoas meios de acesso aos direitos sociais, em particular moradia, alimentação, inserção laboral e proteção à infância. O início da implementação do plano tem prazo de 10 dias.

À Funai, a recomendação é para que o órgão exerça seu protagonismo institucional enquanto agente da política indigenista para articular e executar medidas de assistência aos migrantes venezuelanos indígenas residentes no estado, sem prejuízo de atendimento aos indígenas brasileiros.

Deverá ser elaborado, no prazo de 15 dias, um plano de atuação que contemple, dentre outras ações, a identificação de grupos em situação de vulnerabilidade para atender e orientar seus integrantes na busca por seus direitos. O início da implementação do plano tem prazo de dez dias.

SEGURANÇA – O MPR recomendou à Sesp e à Polícia Militar que, no prazo de 10 dias, disponibilizem policiamento ostensivo e ininterrupto no Centro de Referência do Imigrante, a fim de garantir a segurança dos indígenas e demais pessoas que se encontram no local.